Brasil
Mapa - referências
A. Capítulo 4
B. Capítulo 4
Breve nota sobre o contexto
nacional
A política indigenista no Brasil teve na figura jurídica da tutela seu principal instrumento. Com a criação, em 1910, do Serviço de Proteção aos Índios e Localização de Trabalhadores Nacionais, conhecido como SPI, os povos indígenas passaram a ser tutelados pelo governo federal e assim continuaram até a Constituição Federal de 1988. Como justificativa para a proteção de seus territórios sem que os demais setores da população se sentissem lesados, o Estado brasileiro criou a figura do índio como “relativamente incapaz” para exercer direitos e deveres da cidadania, até que, “aculturados”, eles passassem a pertencer plenamente à “comunhão nacional”. Com isso, as terras indígenas passaram a pertencer à União, com o usufruto permanente e exclusivo de seus habitantes originais até o momento em que fosse “emancipados”. Instaurou-se, oficialmente, a infantilização dos povos indígenas quando entraram no Código Civil de 1916 na categoria de seres relativamente incapazes juntamente com menores de idade, mulheres casadas e filhos pródigos. Um após outro, povos indígenas autônomos passaram a ser assediados pelo Estado brasileiro que os queria sob seu controle. Criaram-se as “frentes de atração”, mecanismos abusivos de sedução, geradores de dependência econômica do Estado e/ou da sociedade circundante, concentrando-os em pálidas parcelas de seus territórios tradicionais e, assim, liberar as terras para a ocupação de forasteiros, fossem posseiros pobres, latifundiários ou empreendimentos estatais. Sob a aparência de magnanimidade humanitária, o Estado brasileiro despojou quase todos os povos indígenas do interior do Brasil ... e continua a fazê-lo. A grande aporia da política indigenista brasileira gira em torno da incontornável contradição entre proteger povos e territórios indígenas e, ao mesmo tempo, promover o desenvolvimento econômico do país. A história das relações interétnicas no Brasil demonstra que o segundo desígnio tem sempre prioridade sobre o primeiro. Invasões, expurgos, massacres, abandono e omissão ativa têm sido os mecanismos favoritos para lidar com essa contradição.
1. O genocídio Guaraní- Kaiowá em curso
Tonico Benites
Este capítulo descreve a situação
atual do Povo Indígena Guarani-Kaiowá de Mato Grosso do Sul, em que as
famílias, vítimas de violência permanente, lutam, resistem e sobrevivem em
minúsculas parcelas de terra, recuperadas num clima conflituoso que já fez
inúmeras vítimas.
Tonico Benites, antropólogo Guarani-Kaiowa, compôs seu texto utilizando cartografias, entrevistas e visitas às terras indígenas recuperadas, onde ocorreram massacres, tortura e assassinato de líderes promovidos pelos jagunços e agentes de segurança privada contratados pelos fazendeiros invasores.
Tonico Benites, antropólogo Guarani-Kaiowa, compôs seu texto utilizando cartografias, entrevistas e visitas às terras indígenas recuperadas, onde ocorreram massacres, tortura e assassinato de líderes promovidos pelos jagunços e agentes de segurança privada contratados pelos fazendeiros invasores.
Evidências do ataque à comunidade de Avaeté, parte do território tradicional Guarani-Kaiowá retomado em 2021. Região da cidade de Dourados, Mato Grosso do Sul, 2021. Cortesia: Luciana Oliveira
︎︎︎Guarani Kaiowá denunciam ataques com bombas de efeito moral, incêndio e pulverização de agrotóxico nas retomadas Avae’te, em Dourados
2. O genocídio e a restituição da identidade xetá: contribuições ao fazer antropológico colaborativo
Carmen Lucia da Silva e Esther Jean Langdon
Em meados do século XX, o Povo
Indígena Xetá, da família linguística Tupi Guarani que tradicionalmente ocupava
o noroeste do estado do Paraná foi à extinção. A história do extermínio dessa
sociedade, desde seu primeiro contato oficial até a dispersão dos oito últimos
sobreviventes, todos menores, é um exemplo eloquente da violência que os povos
indígenas têm enfrentado no Brasil.
A partir da experiência dos Xetá, este capítulo retrata um genocídio em três sentidos: ambiental, pela perda da floresta e do território; físico, pela perda de vidas; cultural, pelo roubo de crianças e dispersão de famílias extensas, provocando a perda da língua e das formas tradicionais de vida. O capítulo é também uma homenagem à resistência silenciosa de pessoas que, dia após dia, lutaram contra o esquecimento para manter vivos seu passado e origem e, com eles, projetar seu horizonte de futuro.
A partir da experiência dos Xetá, este capítulo retrata um genocídio em três sentidos: ambiental, pela perda da floresta e do território; físico, pela perda de vidas; cultural, pelo roubo de crianças e dispersão de famílias extensas, provocando a perda da língua e das formas tradicionais de vida. O capítulo é também uma homenagem à resistência silenciosa de pessoas que, dia após dia, lutaram contra o esquecimento para manter vivos seu passado e origem e, com eles, projetar seu horizonte de futuro.
Mapa do território Xetá no estado do Paraná
Imagens:
Arquivo do Museu Paranaense
3. O poder imoral
Patrícia de Mendonça Rodrigues
A partir de um diálogo com concepções javaé
sobre carreteras de autotransformação, este capítulo apresenta um relato do
genocídio invisível dos povos indígenas do Médio Rio Araguaia (Karajá, Javaé,
Tapirapé, Xavante e Avá-Canoeiro do Araguaia), com ênfase no impacto letal da construção
de rodovias de integração nacional naquela região no século XX.
Fotografias: Todas as fotografias referem-se aos Avá-Canoeiro.
4.
Povos indígenas no Brasil
Felipe Sotto Maior Cruz (Felipe Tuxá)
Nas
últimas décadas, o Movimento Indígena no Brasil tem usado distintas estratégias
de incidência política em espaços interétnicos para a defesa de seus direitos.
Esse processo se acelerou nos últimos anos devido à escalada da violência
anti-indígena, perceptível no desmantelamento da política indigenista, na
invasão de territórios e na vulnerabilidade cotidiana dos direitos essenciais.
A participação indígena também aumentou em diversos espaços através de suas
lideranças tradicionais e ativistas indígenas com formação acadêmica em áreas
como direito e antropologia. Este capítulo analisa as estratégias indígenas
para acessar instrumentos jurídicos em busca de justiça, enfatizando o debate
sobre o conceito de genocídio aplicável a uma vasta gama de procedimentos
letais denunciados por advogados e organizações indígenas. O objetivo é
analisar de maneira intercultural as categorias básicas do ordenamento
jurídico, como o conceito de genocídio, noções de morte e vida e ontologias
sobre os seres vivos.
Links relacionados:
︎︎︎Imagem da campanha "A municipalização da saúde indígena é declarada genocídio" da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil.
︎︎︎Campanha das lideranças indígenas da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil para a Europa que aconteceu entre os dias 17 e 20 de outubro de 2019.